Paisagem Intuída











Cotton yarn on wood
280x190 cm
Kubikulo Project - Kubik Gallery 

Porto - 2014

Certas imagens têm a capacidade de se alaparem a palavras como se entre elas corresse uma afinidade siamesa. O mesmo sucede com Paisagem Intuída.
Deste lado do vidro que separa a rua, da parede da galeria onde a obra se construiu, não sou levado a pensar no título da obra (dessa capacidade sensacional de conseguir reconhecer uma imagem antes de ela se revelar à nossa frente), mas da palavra jorrar. Fico preso à atitude de uma matéria que fende outra, que a irrompe - dos fios pretos que parecem nascer da parede. E embora a tendência imediata seja para reconhecer o efeito da gravidade - que os fios caem da parede até ao chão da galeria - como garantir daqui, da rua, do lugar onde esta imagem funciona como paisagem, qual a direcção do jorro? Só entrando lá dentro. Mas aí, a paisagem dissolve-se, e o corpo é tomado pelo jorro, pelo caudal. Sobra o arrasto, faltando ainda perceber se para fora ou para dentro da parede. A resistência de pouco vale.
A transição entre o afastamento e a proximidade essenciais ao funcionamento de Paisagem Intuída e inclusive à ideia de intuição/pressentimento) são fundamentais para o resultado da obra - quer como representação, quer como situação. Neste comportamento, Paisagem Intuída concentra propriedades importantes da obra de Patrícia Geraldes. A mais importante resulta da combinação entre a exploração formal de linhas e emaranhados e um potencial semântico insinuando o tema do envolvimento. Paisagem Intuída resulta de um acto simples, delicado e expansível. E não podia ser de outro modo: o envolvimento é sedução particular que se quer, tanto quanto possível, despojada e imersiva. 

André Alves



Uma imagem para o pensamento
Uma fracção de segundo separa a dupla existência das coisas – vermos a coisa e a coisa estar lá a ser vista. Cada uma dessas existências é, em si mesma, um sistema. Existe e tem vontade própria, cada uma dessas existências tem a sua pele, os seus músculos e os seus órgãos. Mas acontece partilharem, na influência deste acto que é ver/ser visto, desejos e sonhos.
E a coisa, realmente, nunca é (somente) a coisa vista nem a coisa que está lá para ser vista. É, talvez, aquilo que acontece ainda antes, quando as palavras se evadem, se escondem, zombam de não as podermos possuir por inteiro; é nesse instante sem tempo que está a coisa. Poderia dizer que (n)esse estado é (está) a imaginação, mas não é só isso. É, uma coisa pre(s)sentida, existente ainda antes de ter nascido, quase uterina, víscera, sangue, matéria.
Não é visível mas é a razão de toda a visão; e é desse sentimento que saem todos os nomes e respectivas qualidades atribuídas às coisas.
Ainda antes de existir (ser vista) a coisa já se sabe a si própria, como parecendo possuir uma maravilhosa capacidade de se imiscuir nos nossos pensamentos para de lá retirar a sua imagem.


Cláudia Lopes


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